segunda-feira, abril 25, 2005

PORTUGAL E A CRISE:O retorno dos Impostos - a educação (V)


Os problemas reais de tal estado de coisas na Educação parece “ninguém” os querer estudar seriamente e, ainda menos, dar-lhes uma solução que não seja “premiar” ainda mais a “educação para a incompetência” com mais dinheiro público!

Por exemplo, imaginar-se-ia, alguma vez, ouvir profissionais da educação pronunciar-se contra a “avaliação” do ensino e das escolas porque, segundo eles dizem, é a avaliação que “cria” desigualdades?
Porque não querem esses “profissionais da educação pública” que elas (as desigualdades) sejam detectadas? Será que a amiga do meu irmão terá razão: “assim os nossos filhos têm emprego”?

Qual é a “Pedagogia”, enquanto Ciência, que está a ser aplicada por “esses” que são capazes de uma tal afirmação?
Infelizmente todos “sentimos” que a Pedagogia deixou de ser uma Ciência em Portugal!

As Ciências humanas são sem dúvida áreas de conhecimento muito complexas (sistemas sobredeterminados), portanto difíceis de ser tratadas, aonde o risco ao subjectivismo é elevado e o “laboratório” nem sempre pode existir.
Contudo, a pedagogia é uma das raras áreas das ciências humanas aonde pode haver bastante “laboratório”; e as escolas são-no. A Pedagogia pode testar, todos os dias, as suas teorias na prática e pode avaliar a maior ou menor validade dessas teorias (em oposição a outras ciências humanas que pouco mais têm que a História - em especial, a História Comparada - para o fazerem.)

Como é pois possível que a educação esteja com resultados cada vez piores e alguns pedagogos continuem a defender os modelos de ensino praticados?

Que “ciência” foi ensinada a esses “pedagogos” que desconhecem a essência da “validação” cientifica: “a validação da teoria pela prática”; quando a “prática” desmente a teoria, é porque a teoria está errada e no mínimo, é preciso procurar outra teoria e promover uma outra prática!

Bem, estou a admitir que ainda há estudiosos, em Portugal, preocupados com o ensino, enquanto área susceptível de tratamento científico e não apenas que o ensino é um domínio de “outros” objectivos.

Como as coisas estão e considerando a elevada taxa de desistências existente em Portugal, ainda aparece algum “pedagogo” a propor como solução, dar ainda menos “trabalho” aos alunos, tornar as aulas mais “divertidas” e não lhes fazer nenhuma avaliação (e a eles, pedagogos, naturalmente!) de molde a melhorar, rápida e decisivamente, as “estatísticas”.

Parece que ainda ninguém se perguntou se as altas taxas de desistência não estarão precisamente na não preparação do aluno para o “trabalho”, na inexistência de objectivos “de saber” a alcançar, num deixa andar contínuo e sem avaliação (como se aprendêssemos por osmose oral no contacto com os professores), na brincadeira das aulas, num encaminhamento contra a vontade do estudante, etc.

Será que algumas causas das desistências dos alunos não estarão ligadas de algum modo às mesmas causas que tornaram os profissionais da educação a classe profissional, em Portugal, que mais tem de recorrer aos psiquiatras e psicólogos?

Será que as causas das desistências (e dos resultados do ensino) não terão a ver com a inexistência de verdadeiras “escolas” em Portugal; inexistência de “escolas” no sentido da não existência de um “corpo” permanente (de docentes, discentes e auxiliares) uma vez que parte significativa dos docentes (e até auxiliares) é recolocada todos os anos e as escolas não têm autonomia de gestão que lhes permita promover soluções pedagógicas e se auto responsabilizarem pela sua própria eficiência educativa.

Parece-me que o Estado português reduziu o conceito de “escola” à “imobiliária”: edifícios, laboratórios, computadores, ligações à Internet, etc., embora frequentemente muito mal preservados e actualizados!
O Estado português preocupa-se com o “hard” da "escola" (em especial se for para comprar ou fazer "novo") e esquece-se da parte “soft” (professores e auxiliares, organização, resultados, avaliação, etc.), muitíssimo mais importante e decisiva no processo educativo.

De facto, com o modelo de educação existente, os nossos filhos nem são psiquicamente preparados na escola para enfrentar a vida de adultos que os espera.

Para muitos seres biológicos e, naturalmente, para o homem sapiens, ao longo de milhares de anos, a infância e a juventude representam não só períodos de conclusão de crescimento biológico mas também períodos de “aprendizagem” com vista a poder-se ser um adulto com capacidade de sobrevivência. O brincar à “realidade” constitui parte essencial dessa aprendizagem.
Nós (humanos) inventámos o brincar “brincadeiras” e os pedagogos (alguns) acharam que isso deveria passar a substituir, na educação, o brincar a “realidade”.
Os resultados estão à vista: quando caímos, irremediavelmente, em adultos, não estamos devidamente preparados porque fomos impedidos de não brincar à “realidade” dentro da escola. Felizmente para todos nós, de facto não é bem assim, porque fora da "redoma" em que se constituiu a escola, a única “brincadeira” existente para os jovens (e até para as crianças) é o confronto com a “realidade”.

Hoje a sociedade humana (infelizmente, apenas nos Países desenvolvidos) atingiu um tal desenvolvimento que pode proporcionar a todos os jovens um leque e qualidade de aprendizagem e oportunidades que nunca nenhuma geração anterior à actual alguma vez teve acesso, mesmo para as respectivas elites.

É lamentável não colocar esses meios à disposição das nossas crianças e jovens.

quarta-feira, abril 20, 2005

PORTUGAL E A CRISE:O retorno dos Impostos - a educação (IV)

E quanto à formação superior?

Como vimos, a maior parte dos jovens chega à Universidade ou Instituições similares com uma formação muitíssimo fraca.
É evidente que tal facto resultou também (e por indução) de se ter transformado o acesso às Universidades num problema de “imobiliária” (como, aliás, parece ter passado a ser a resolução preferida do Estado Português para grande parte dos problemas do país). Ou seja, o acesso à Universidade deixou de estar dependente da competência para passar a estar dependente do número de lugares disponíveis em cada Faculdade (por sua vez dependente da capacidade ou vontade de construção “imobiliária” do Estado - aumentar ou construir instalações).

Durante alguns anos tive alguns contactos com a concepção cubana de educação; que se pode resumir no seguinte: a educação deve orientar-se para a quantidade e não para a qualidade; devendo a qualidade emergir dessa quantidade.
Esta concepção, a cubana, fundamentou-se nas concepções iniciais da revolução bolchevique traduzida na palavra de ordem: “operários à Universidade”. Digo “concepções iniciais” porque rapidamente os políticos (e pedagogos) soviéticos se aperceberam que isso não era compatível com a qualidade tão necessária ao desenvolvimento do país, pelo que essa concepção foi prontamente abandonada pelas Universidades da URSS e, pelo que sei, nunca foi aplicada nos países do leste europeu.
Contudo os resultados da concepção cubana da “quantidade” na educação são muitíssimo mais eficazes que a correspondente concepção portuguesa porque em Cuba as escolas são semelhantes às “unidades militares” quanto à disciplina, e os melhores alunos são fortemente salientados junto dos seus colegas como autênticos “heróis” do trabalho.

Parece-me que o Estado Português, do pós 25 de Abril, introduziu em Portugal a parte pior da concepção cubana de educação!

Como é que alunos mal preparados (acedendo às Universidades com médias de 5 e 6) podem receber formação superior com o mínimo de qualidade?

Muito poucas Universidade escaparam a este imenso colapso.
Algumas faculdades, como as de medicina e mais tarde as de enfermagem, escaparam a esse colapso (a “não qualidade” dos formados) através da protecção pelas respectivas corporações que impuseram fortíssimas restrições de acesso àqueles cursos. Outras faculdades, como as de farmacêuticos, protegeram-se no condicionamento do exercício da actividade. Uma ou outra solução, também, profundamente nefasta ao país.

É assim que queremos criar uma sociedade do conhecimento em Portugal?

Portugal já gasta, em Educação, dos “per capita” mais elevados da Europa!
Contudo, ainda há alguns “profissionais do ensino público” que apontam como causa de tal estado de coisas a falta de dinheiro público na Educação. Pelo menos, fácil é a justificação!

Infelizmente, não é só o dinheiro que gastam que não incomoda a esses “profissionais do ensino público”, como se o dinheiro não fosse o resultado do trabalho dedicado e sofrido de tantos cidadãos que têm de pagar um “horror” de impostos.
Não os incomoda também que os seus alunos “saíam” das suas mãos, após, pelo menos 12 anos de escola, sem “nada ou pouco” saberem (às vezes, nem a sua língua escrita, o “português”, são capazes de interpretar correctamente!).
Doze anos na vida de qualquer pessoa são muitíssimo tempo; doze anos na vida de um jovem, se não forem devidamente aproveitados, são uma perda irremediável – irremediável para o próprio e para a sociedade aonde se integra.

É um crime, o que o Estado Português está a fazer com os nossos filhos e à nossa sociedade com o tipo de educação que lhes ministra!

Como foi possível a alguém esperar resultados diferentes desses (a educação da “não – educação) se nem há “objectivos” (definidos e avaliados) a atingir ao longo do processo educativo que tenham consequências na progressão dos estudantes, se o “prémio” ao “não estudo” é idêntico ao do “estudo”?
O critério de acesso a grande parte das faculdades é disso um bom exemplo. No nosso sistema de educação, o critério de acesso ao ensino superior não recai sobre os estudantes, em si, na medida em que não recai na sua maior ou menor preparação (porque esta nem lhes é exigida, na prática). Por absurdo que pareça, o critério de acesso às faculdades é exclusivamente um critério político dependente da maior ou menor capacidade do Estado (e vontade politica deste e, num caso ou noutro, no poder das respectivas corporações) em abrir mais “lugares” nas faculdades – os alunos entram nas faculdades pelo número de vagas existentes e não pela sua preparação!

As consequências sobre os jovens e a sociedade portuguesa são devastadoras.

E não se trata só da má preparação dos jovens.
Trata-se de que a sociedade dá, a esses jovens, um “sinal” errado (será errado?) sobre os “valores” dessa mesma sociedade: o sinal de que não é preciso nem é importante “saber”.
A esses jovens, a exigência da “educação” formal, deve “parecer-lhes”, no fundo, uma questão “política”: a da opção “politica” mais ou menos favorável à distribuição de certificados de frequência e diplomas. A “exigência de trabalho” deve parecer-lhes a opção “politica” de uns “malfeitores” que só lhes querem dificultar a vida!

O sistema educativo existente em Portugal é pois um bom exemplo de uma das causas que conduzem à caracterização feita pelo filósofo José Gil sobre os portugueses.

sábado, abril 16, 2005

PORTUGAL E A CRISE: O retorno dos Impostos - educação (III)

E, quanto à formação normal, primária e secundária; o que se passa?

Todos reconhecem que houve um aumento significativo do número de portugueses com o 12º ano de escolaridade. Contudo todos também sabem como Portugal tem uma taxa elevada de iletrados e como os estudantes acabam o 12º ano cada vez mais mal preparados.

Durante alguns anos dei aulas de matemática numa Universidade. Fiquei “aterrorizado” porque o nível de ignorância de grande parte dos estudantes era tal que nunca lhes teria sido possível “passar” do antigo 3º ano do liceu (actual 7ª classe), quanto mais terem feito o 12º ano e entrado numa Faculdade, na qual os esperava várias cadeiras de matemática! Os colegas que leccionavam outras disciplinas queixavam-se de algo semelhante.

É a isso que eu chamo uma politica de educação que visa a “não – educação”. Massificar este tipo de educação (a que o Estado Português promove) é massificar a “não educação” (e não, a “educação”).

Democratizar a educação não é aumentar o “tempo de permanência” dos jovens nas escolas como se estes pudessem aprender por simbiose no, longíssimo, contacto que passaram a ter com os professores (12 anos).
Democratizar a educação não é a distribuição de certificados de frequência ou diplomas “sem conteúdo”.

Democratizar a educação não é a transformação de taxas de analfabetismo em taxas de iletrados. Não é a transformação de cidadãos não habilitados por cidadãos pouco habilitados.

Democratizar a educação não é “despejar” dinheiro (que custa muitíssimo trabalho e sacrifício a muitos - embora não custe nada a outros!) para se “distrair” (“enganar”, seria o termo mais correcto) grande parte da nossa juventude (e seus pais) em algo que não é, de facto, aprender e cuja “utilidade social” (definida centralmente pelo Estado) é duvidosa.

Mas é isso que o Estado Português faz. Quer se queira quer não, este é o resultado da centralização da educação no Estado e nos “bem intencionados” que o dirigem.

Aliás parece-me que se faz algo no ensino normal semelhante ao que se fez com a formação profissional subvencionada pela União: o objectivo do ensino parece não ser formar os jovens “devidamente”. De facto, parece que o objectivo da educação, para além das “estatísticas”, é constituir uma forma de redistribuição de parte da riqueza nacional, recolhida pelos impostos, entre “funcionários públicos”, neste caso os professores e as instituições públicas e privadas envolvidas no sistema de educação!

E a este respeito, não posso deixar de salientar aqui a resposta dada por uma professora universitária ao meu irmão (também professor universitário) sobre a crescente ignorância que os estudantes manifestam ao entrar na Universidade e as graves limitações (grande parte, inultrapassáveis) que isso acarreta à sua formação na própria universidade: “Não te preocupes; assim os nossos filhos têm emprego garantido”.

Alguém, que seja honesto, pode considerar isso a democratização da educação?
Esta é a forma como a “democracia” portuguesa garante competência e igualdade de oportunidades aos seus cidadãos?

Independentemente de quaisquer outros “princípios”, neste sistema (o português), ainda há quem pense que continua a viver numa sociedade “fechada”, na qual ainda seria possível ao seu filho, melhor preparado, disputar um “lugar” com o filho do vizinho “propositadamente” mal preparado.
Ainda não se aperceberam que estão num mundo globalizado (e, até, num País que já faz parte de uma Comunidade mais vasta), no qual a circulação de pessoas e bens será cada vez maior (já o é, de capitais).

As “regras do jogo” alteraram-se profundamente.
A “educação” do filho do vizinho na “incompetência” impossibilitará o exercício “competente” do seu filho e manterá a sociedade em que estes vivem como “sociedades incompetentes” e incapaz face a muitas pessoas e sociedades com as quais têm de se confrontar todos os dias; até já dentro do seu próprio País.
Ainda não se aperceberam que uma “sociedade incompetente” tornará incompetente mesmo os “competentes”e que as “sociedades competentes” são hoje cada vez mais capazes de impor a sua presença a todo o planeta.

Hoje é cada vez mais difícil preservar nichos de “excepção” na mão de alguns “eleitos”, nomeadamente se sustentados na não educação ou, pior ainda, na “educação” para a incompetência.

Hoje, a “solidariedade social positiva” é, mais que nunca, uma condição de sobrevivência de “todos”. Essa solidariedade (social positiva) começa com o meu vizinho: é essencial, para o meu bem e futuro dos meus filhos, que os filhos dele sejam tão ou mais competente que os meus.

De facto, o Estado Português parece estar ainda imbuído de um conceito “primário” de solidariedade social e de igualização social!
Um conceito contra a igualdade efectiva entre cidadãos, porque não só “mergulha” as suas raízes no tipo de relação do “rico com o pobrezinho” e do “poderoso com o coitadinho” como, pior ainda, parece pretender preservar a continuidade desse tipo de relações; agora transmutada numa relação do “Estado (e quem o dirige) e os seus súbditos (a quem têm a ousadia de chamar cidadãos!)”.

Este tipo de educação é o tipo de “retorno” que o Estado nos dá do dinheiro que lhe entregamos e que justifica, em parte, os pesados impostos que lhe pagamos?

Que tipo de confiança (e esperança) podem pois ter os cidadãos portugueses em colocar, integralmente, nas mãos do seu Estado a decisão da educação dos seus filhos?

terça-feira, abril 12, 2005

PORTUGAL E A CRISE:O retorno dos Impostos

O “retorno”: educação (II)

A nível das formações ditas profissionais (não profissionalizantes), o Estado Português, decidiu acabar com elas, com excepção da formação superior que foi significativamente ampliada.
As escolas profissionais, as escolas comerciais e industriais e os institutos comerciais e industriais foram extintos sem serem substituídos por nada correspondente.
Parece que, por obra de magia, com a Revolução, o País deixou de ter necessidade de trabalhadores especializados ou qualificados, a nível básico e médio!

É certo que foram investidos “milhares de milhões de euros” provenientes da União em formação profissional. Mas, na prática, parece que essa formação profissional se destinava muito mais a “redistribuir” esse dinheiro do que a fazer formação séria. As escolas e centro de formação, criados apressadamente para essa “redistribuição”, desapareceram praticamente todos logo que os subsídios diminuiriam significativamente.
Ou seja, gastaram-se milhares de milhões de euros e o País não conseguiu construir e preservar uma rede de escolas e centros de formação profissional, e muitíssima pouca gente foi formada devidamente para poder exercer função correspondente.
Teve, contudo, a vantagem de distribuir uns salários (o que diminuiu a taxa de desemprego) e terá “enriquecido” mais uns cidadãos; o que seria muitíssimo bom para o País se isso tivesse sido uma consequência natural do seu trabalho, do seu mérito e dos resultados obtidos e, não só, essencialmente, devido a uma relação privilegiada com quem decidia, na administração pública, a atribuição dos respectivos subsídios.
Ou seja, para parte desses centros, o importante nunca foi a formação realizada e a sua utilidade para o cliente (estudante). O que os preocupava sempre foi a relação com quem lhes pagava e podia manter ou não os subsídios, ou seja, a relação com o Estado – o que é natural, porque o cliente era realmente o Estado e não o estudante!
Estou convencido que os resultados teriam sido muitíssimo diferentes se a subvenção do Estado não fosse dirigida aos centros de formação mas sim directamente aos estudantes; cabendo a estes o pagamento ao centro que escolhessem e o tipo de formação que lhes interessava.

Em consequência, as poucas escolas profissionais, ainda hoje existentes no País, têm filas de espera intermináveis à data das respectivas inscrições.
Mas, finalmente, parece que o Governo actual (estamos em 2005!) discute a reposição da rede das antigas escolas e institutos comerciais e industriais ou algo que se lhe assemelhe!

Com a política educativa promovida pelo Estado português, as profissões de pedreiro, carpinteiro, electricista, serralheiro, canalizador, etc. (quadros básicos) passaram a ser como que profissões “marginais”.

De igual modo, em grande parte, os cursos médios foram abolidos ou passaram a superiores. Até, os “antigos” quadros médios (agentes técnico de engenharia, educadoras sociais e de infância, etc.) foram (pós) graduados em técnicos superiores; muitos com o nível de bacharéis.

Mesmo os recém criados Institutos Politécnicos passaram a ensino superior.

Será que a sociedade portuguesa, de repente, deixou de ter necessidade de quadros básicos e médios? Será que só tem necessidade de quadros superiores?

As sociedades, quanto mais desenvolvidas forem, mais exigem uma organização social do trabalho aonde a especialização é não só intensa como abrangente praticamente todas as esferas de actividade.
Nessa organização social do trabalho é insubstituível a existência e o exercício de funções cujo desempenho se reparte entre quadros com níveis e especificidades de preparação distintas, nomeadamente nas quais tem razão de ser a diferença entre quadros de níveis básicos, médios e superiores.

É a função que se exerce que define o nível e formação necessária ao quadro (ou trabalhador) que a realiza e não o contrário.
Se um engenheiro electrotécnico exerce a função de electricista ele está, nessa função, a ser electricista e não engenheiro. Aliás, frequentemente, esse engenheiro será um mau electricista porque ele não foi preparado para essa função.

Como a realidade se impõe a todos independentemente do que os políticos (e as políticas) apregoam; frequentemente, as empresas não têm outra possibilidade senão pós-graduar (formal ou informalmente) os licenciados (quadros superiores) em quadros médios, apesar de quase sempre indevidamente preparados para o exercício de tais funções.

Às vezes, é o próprio quadro superior que se pós-gradua, muitas vezes até em quadro básico ou, mesmo, em funções indiferenciáveis como por exemplo ao assumirem funções de “caixa” ou “motorista”. E naturalmente o seu salário é o correspondente à função e não ao “diploma”.

Isso não é um problema de mercado como alguns políticos podem apregoar em defesa das políticas que têm andado a promover ao longo destes anos!
Isso é o resultado de uma distorção (gravíssima) introduzida no mercado do trabalho por uma politica inadequada de educação.
Isso é o resultado de uma visão “administrativa” do Estado sobre a sociedade e seu funcionamento; visão que o Estado pode impor a si mesmo mas que não pode impor a uma sociedade aberta, inserida num mundo globalizado.

Por exemplo, não me parece admissível que a função de electricista possa desaparecer porque alguém ache que o 12º ano (hoje, obrigatório) mais uns anos de aprendizagem “obriga” a que o lugar seja ocupado por um técnico definido “administrativamente” como médio ou superior!
A função de electricista na organização social do trabalho não mudou. Como não mudaram as funções que exigem quadros médios em electricidade ou quadros superiores.

Quem possa exercer a função de electricista pode ter maior ou menor formação de base (por exemplo o 12º ano mais uns anos de formação profissional), mas ao exercer essa função está a exercer uma função “básica” (de quadro de base) na organização social do trabalho (numa empresa, por exemplo) e não uma função de quadro médio ou superior, por muitos anos de estudos que tenha tido. Isso não significa que esse electricista não possa auferir um salário superior ao seu “colega” de formação média ou superior.
Ainda o ano passado tive conhecimento, na imprensa inglesa, de um Phd em Física que largou a investigação para ser canalizador pois nesta profissão poderia pagar a divida que tinha contraído com o Banco para pagar os seus estudos enquanto que como Físico não o conseguiria fazer!
Este Phd ao exercer a função de canalizador está a ser um quadro básico e não um quadro superior. A entidade que lhe paga atribui-lhe o salário correspondente à “utilidade social” do seu trabalho ou função - neste caso o salário de quadro básico é bem maior que os praticados em muitas áreas da investigação.

Com excepção do Estado, a quem lhe pagam as “contas”, as empresas remuneram os seus empregados pelas funções que exercem e não pelo “diploma”. A não ser, que o respectivo salário de “diplomado” seja subvencionado pelo Estado como por exemplo irá acontecer com a actual politica de colocação de recém licenciados nas empresas privadas ou, com uma proposta que já ouvi, para que se coloque os quadros excedentários do Estado em empresas privadas, cobrindo o Estado a diferença entre os salários praticados neste sector e o sector público.

sexta-feira, abril 08, 2005

PORTUGAL E A CRISE: Parte IV - O retorno dos impostos

Acabámos de ver como o sistema fiscal não só é profundamente desigual e pouco transparente como é fortemente permissivo à discricionariedade “administrativa” quer quanto às pessoas singulares (cidadãos) quer quanto às pessoas colectivas (empresas, etc.).

Mais ainda; vimos que o sistema político que subentende esse sistema de impostos é, intrinsecamente, anti – democrático porque transfere para o Estado a capacidade de exercício de cidadania de grande parte dos portugueses, e que aquele (Estado) se organiza de molde aos cidadãos não poderem eficazmente controlá-lo e, muito menos, responsabilizá-lo pelos seus actos.

De qualquer modo, este sistema político, que “organiza” o Estado e a sociedade portuguesa, justifica tal sistema de impostos como sendo a única forma de garantir o fomento da solidariedade e da igualdade social entre os portugueses e a (quase –) única forma de promoção do desenvolvimento nacional (para além do investimento estrangeiro). Ou seja, o exercício activo da cidadania pelos portugueses é fortemente minorado nesta concepção de organização e funcionamento do Estado.

Vamos pois procurar investigar se o tipo, qualidade e eficiência do “retorno” oferecido aos cidadãos através das políticas económicas e sociais promovidas pelo Estado justificam uma tão elevada “estatização” da sociedade portuguesa e um tão elevado esmagamento na capacidade de exercício da cidadania da maior parte dos portugueses.

O “retorno”: educação (I)

A importância da educação não oferece quaisquer dúvidas quer quanto ao indivíduo quer quanto à sociedade aonde se integra.
Aliás, para grande parte dos seres vivos, a educação (aprendizagem) constitui um imperativo quase “biológico” uma vez que vem intrinsecamente “associada” ao desenvolvimento biológico de cada indivíduo.

Penso pois que a educação será dos sectores que menos dúvida oferece quanto à atenção que a comunidade lhe deve assegurar, inclusive porque ela mesmo, comunidade, é significativamente afectada (para o bem ou para o mal) pelo tipo de educação ministrada aos seus membros.

Afirmar que esse papel só, ao Estado, cabe exercer e que lhe deve ser (quase -) exclusivo é, no mínimo, um pretensiosismo de quem controla o Estado.
As elites que controlam o Estado sabem bem que o controlo da educação (da não educação ou até da deseducação do que não lhes interessa) é uma ferramenta poderosíssima, pelo que democratizar quem a faz, nem sempre lhes convém.

Infelizmente a história de Portugal é um bom exemplo da luta de centralização da Educação no Estado (inclusive contra a Igreja, nomeadamente os Jesuítas). Mas os resultados dessa luta pelo controlo da educação nas mãos do Estado estão bem patentes nos índices elevadíssimos de analfabetismo com que o País chegou a 1975.

São maiores os exemplos dos países com taxas de analfabetismo elevadas aonde a educação é exclusiva do Estado do que naqueles que deixaram à iniciativa dos cidadãos ampla margem de intervenção.
Aliás muitíssimos países (nomeadamente os anglo – saxónicos e, alguns, do norte e centro da Europa) mantêm a “velha” tradição de preservar o papel activo que cabe à sociedade civil na promoção da educação formal , inclusive às instituições religiosas.
Talvez não seja por acaso que têm índices tão elevados de alfabetizados e letrados (desde há vários séculos).

Evidentemente que a intervenção activa da sociedade civil na educação não minora o papel que o Estado tem de ter na educação formal, nomeadamente na definição de politicas, fiscalização, avaliação e responsabilização pelas práticas seguidas.

Mas Portugal “continua” a sua secular tradição de centralizar a educação no seu Estado. Pós 25 de Abril, o Estado Português ainda centralizou mais a educação do que Salazar já fazia, com excepção da relativa ao ensino superior.

Após anos de execução da politica educativo que tem vindo a ser perseguida em Portugal, pelo seu Estado (pois a educação é-lhe quase exclusiva!), que resultados foram alcançados?

Sem dúvida que assistimos ao acesso massificado ao ensino. Finalmente isso acontece em Portugal com um atraso de cerca de quase cem anos relativamente aos países desenvolvidos!

O número de alfabetizados e de licenciados subiu significativamente.

Mas, as boas noticias, parece que acabam por aqui!

O acesso massificado ao ensino, sendo uma condição necessária à educação massificada, não é uma condição suficiente.
Pode acontecer, inclusive, que o acesso massificado ao ensino pode não representar educação massificada mas precisamente o seu contrário: a massificação de uma “não - educação”, como veremos!