quinta-feira, maio 19, 2005

PORTUGAL E A CRISE:O retorno dos Impostos - a educação (IX)

Assim sendo, é essencial chamar ao sistema educativo a participação activa dos cidadãos e da sociedade civil; quer na execução da política educativa como na sua concepção e na sua avaliação.

Estou convicto que se isso for realizado criar-se-á toda uma dinâmica social que induzirá a emergência de um processo auto - evolutivo (auto - transformação) do sistema educativo, em si.

Tal participação (a dos cidadãos e da sociedade civil) auxiliará a transformação do actual sistema educativo (estatizado e monolítico) mesmo contra as forças das corporações (professores, etc.) e contra os hábitos prevalecentes neste sistema. O sistema educativo, por esta via, tornar-se-á mais aberto e susceptível às exigências do meio envolvente, a quem tem de servir.

Contudo, mesmo isso, não é fácil de implementar, em Portugal.

Para além da oposição exterior ao Estado às alterações do sistema educativo (por exemplo, das corporações e dos hábitos prevalecentes no sistema), há uma cultura interior ao Estado que é contrária ao que proponho; há uma cultura contrária à participação activa dos cidadãos e da sociedade civil.

Portugal (e muitos outros países da Europa) tem uma sociedade estruturada numa longa tradição de intervenção (totalitarista) do Estado e, consequentemente, possui uma cultura que minora activamente a intervenção dos cidadãos na sociedade.

Essa tradição é tão marcada que, inclusive, quando se fala em fazer evoluir qualquer “sistema” de estatizado para “não - estatizado” (por exemplo, através do acesso da sociedade civil a determinadas actividades, nomeadamente através das privatizações), as soluções adoptadas passam sempre por alguma forma de estatização do novo sistema, criado com a dita des – estatização.

Ou seja, o carácter interventor e totalitarista do Estado sobre a sociedade mantém-se, frequentemente, mesmo após a des – estatização.

As disposições legais, ultra – regulamentadas, que acompanham as respectivas privatizações são um bom exemplo dessa desconfiança do Estado sobre a iniciativa dos cidadãos e da sociedade civil.

Frequentemente, o Estado ainda lhes impõe um “cordão umbilical” que chega ao ponto de lhes garantir a “viabilidade” da respectiva actividade, inclusive a sua rentabilidade com subsídios do Estado. Pior ainda, por vezes, o Estado preserva, para si mesmo, um poder de intervenção directo sobre essas entidades, através de “golden-share”.

Naturalmente, o que o Estado faz, não é “privatizar” e, com certeza absoluta, que não é querer transferir poder de intervenção do Estado para os cidadãos e a sociedade civil.

Tal comportamento do Estado Português preserva, de facto, o poder (absoluto) de intervenção do Estado sobre o conjunto da sociedade; o que mudou, através deste tipo de privatização, foi apenas o facto do Estado ter deixado de operar directamente para passar a fazê-lo através de um intermediário privado, escolhido (!) dentro da sociedade civil e mantido estreitamente dependente si, através de um contínuo arbítrio da administração pública.

Aliás, o Estado Português acredita tanto na seriedade e eficiência (?) deste seu comportamento que, apesar dos resultados persistentemente “não positivos”, continua a transformar direcções gerais, e outros serviços, em Institutos Públicos, como se a mudança de uma, quase só, designação (gestão publica para gestão tipo privado) resultasse, por si só, em maior eficiência!

De facto, para o Estado português parece-lhe não se tratar do “mesmo”; mas parece-lhe não se tratar do “mesmo”, porque desconhece realmente os conceitos de gestão privada e de mercado e, desconhece a íntima relação (inter – relação activa) entre gestão privada e mercado; relação, essa, que estrutura esses conceitos.

Não é de admirar que isso ocorra com o Estado português (e, na verdade, com a nossa sociedade civil) quando, mesmo a actividade dita privada, vive a expensas do Estado (da protecção e dos impostos sobre os cidadãos!) e, portanto, muito longe do mercado ; vive, como o denomino, num para - mercado.

Não é de admirar que as possibilidades de corrupção, em tal sistema político e administrativo, se elevem exponencialmente! O mercado é substituído pela decisão administrativa, frequentemente financiada pelos impostos sobre os cidadãos.

A promiscuidade entre Estado e alguns interesses da sociedade civil (frequentemente, protegidos em corporações) é imensa e, necessariamente, bloqueante (e expropriadora) do exercício da cidadania!

A capacidade de decisão autónoma da sociedade civil permanece manietada; pior ainda, a sociedade civil é induzida (e impedida) a não desenvolver iniciativas (ainda menos, com risco próprio) e aprende a ter de dividir a sua responsabilidade com o Estado; para quem corre, a qualquer “perturbação”!

Essa forma de “privatizar” (direi, à portuguesa – embora não o seja) acaba por representar um alargar, ainda maior, da intervenção do Estado “sobre” a sociedade, no seu conjunto.

Já não bastava ao Estado controlar e dirigir o seu “aparelho”; faz o mesmo sobre o “aparelho” civil!

A ausência do exercício de cidadania, existente em Portugal, deveria, pelo menos, envergonhar os intelectuais portugueses, quer de esquerda como de direita.

Mais ou menos conscientemente, Portugal deixou-se estruturar sob (e de molde a salvaguardar) uma nomenclatura constituída pelos funcionários políticos e públicos, à qual se junta os seus “intermediários privados” para “operarem”, em conjunto, sobre toda a sociedade portuguesa.

No seu conjunto (políticos, elites administrativas e intermediários privados – protegidos pelo Estado contra os cidadãos e a viverem dos impostos sobre os cidadãos) constituem aquilo que tenho vindo a denominar de “aristocracia de serviços”; que, segundo a minha opinião, tomou conta do País, em nome dos cidadãos.

Quando eu me refiro, pois, à necessidade de integrar a intervenção dos cidadãos e da sociedade civil no sistema educativo português não é dentro da concepção do papel do Estado sobre a sociedade civil que acabo de acima descrever.

Se assim fosse, o sistema educativo continuaria tão monolítico e estatizado como o é hoje.

A integração dos cidadãos e da sociedade civil no sistema educativo faz-se considerando que toda a sociedade, sociedade civil e Estado, têm responsabilidades educativas que se repartem entre o Estado e a sociedade civil na base de uma relação de interdependência e não, de uma relação de dependência.

Neste quadro, os cidadãos e a sociedade civil devem assumir, por si, todas as responsabilidades e riscos inerentes às suas actividades.

O Estado não tem de ajudar (!) em nada; de facto tem de ajudar - ajudar a que o seu aparelho não se comporte de forma corrupta e segundo critérios de discricionariedade e arbítrio que transforma os seus decisores administrativos em “ditadores” que têm de ser comprados para que a Lei se cumpra.

A integração da sociedade civil no sistema educativo não se faz, pois, “privatizando”, à “moda portuguesa”, o sistema educativo do Estado (como, por exemplo, se está a fazer na Saúde!?).

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