Não direi que não terão razão. Contudo, parece-me que, olhar a questão deste ponto de vista tolhe a solução, porque os “tempos mudaram”.
Quando os países eram fechados, quando os governos e suas elites (públicas e privadas) podiam repartir entre si a colecta dos impostos e as “remessas” dos imigrantes (mais “nacionalistas” que elas; talvez, porque desconhecedoras da forma como essa apropriação, indevida, se efectuava no seu País), quando o trabalho podia ser mal pago ou porque a “autoridade” (pública) o impunha ou porque essa autoridade desvalorizava a “moeda” segundo os seus interesses e impedia o acesso dos cidadãos a outras moedas; enfim …, quando era possível às elites (públicas e privadas), sempre acantonadas no e sob o Estado, manter o “curral” (assim designavam os romanos, na república, aos povos que lhes pagavam impostos) para sua exclusiva “exploração”, a resolução das Crises passava pelo aumento da exportação e diminuição das importações (o “velho” Colbert!).
Ou seja, sendo a Crise uma “crise das elites” (até porque ninguém se preocupava com a “contínua” crise dos membros do “curral”); o mesmo será dizer, sendo uma crise do Estado, já que essas elites viviam do subsídio quer em espécie (subvenções e encomendas “condicionadas”) quer pelo exercício da autoridade (salários baixos, etc.) e do poder legal (desvalorização da moeda, condicionamento comercial e industrial, apoio às corporações e ordens, etc.); de facto, o aumento do fluxo externo de moeda (aumento das exportações, aumento das remessas dos imigrantes – permissão de imigração - e aumento de turistas) era uma forma de repor a “qualidade de vida” dessas elites e o equilíbrio do estado – “cofres públicos cheios, muito para redistribuir”!
Apesar dos tempos serem outros, há economistas portugueses que continuam a olhar a Crise da mesma maneira.
Sejamos honestos, não são só economistas (políticos e elites) portugueses a pensar dessa maneira; quando a Europa “se olha como um grande mercado”, sem se dar conta, “alguém” pode estar a olhá-la como um “grande curral”: já que não podemos fechar as fronteiras dos pequenos países europeus, fechemos a Europa só para nós (para … “eles”, evidentemente!).
A quantos economistas ouviram falar dos 2 milhões de portugueses que são pobres? A quantos economistas ouviram falar dos mais 2 ou 3 milhões de portugueses que não estão muito longe daqueles?
Não ouviram!
Eventualmente ouviram-no a algum sindicalista de esquerda – mas os “modelos de esquerda” já provaram do que são capazes de fazer com a “pobreza”: agravam-na e generalizam-na (hoje, até há História: já não pode haver ignorância da “experiência”, já não há “desculpa” para persistir nos seus “modelos”, mesmo que “adoçados”).
Porque não ouviram aos economistas portugueses associar o Orçamento com a pobreza interna?
Pelo mesmo motivo que Guterres afirmou que Portugal não estava em Crise porque um milhão de portugueses ia de férias ao “Algarve”.
Os 2 milhões de pobres (e três ou quatro milhões que estão perto) não entram no cômputo para a Crise: são os membros do Curral.
E nesse sentido Guterres tinha razão: Portugal não estava em Crise; e daí à “alarvice” (do aumento) da despesa pública foi um ápice (mas, já vinha de antes: não há muito, tinham começado a chegar os “dinheiros da União” e … Cavaco fez “sucesso”).
Hoje, está-se em Crise não porque tenhamos 2 milhões de pobres (mais uns …); está-se em Crise porque, estando os membros do “curral” atafulhados de impostos e dívidas (não se lhes pode pedir mais sem haver problemas “verdadeiramente graves”), não é possível manter os privilégios e regalias das elites públicas e privadas. Ou seja, o tal um milhão de portugueses, de Guterres, que definem “a Crise, à portuguesa”, é que deixaram de poder ir para o “Algarve”!
Estamos em crise porque é preciso aumentar o tempo das reformas de uns (já, da pequena elite) para manter a dos outros, cortar nos direitos de uns (já, da pequena elite) para manter alguns nos outros, etc.; estamos em crise porque os subsídios do estado e as encomendas “condicionadas” diminuiriam e devem diminuir ainda mais; estamos em crise porque temos de desproteger “um pouco” as “farmácias”; estamos em crise porque não podemos desvalorizar a moeda e fazer o “curral” trabalhar mais; etc.
Estamos em crise …, porque “alguns” (e não são poucos) ainda se estão a borrifar para a crise: “enquanto há para arrebanhar que se arrebanhe”.
Estamos em crise porque o "curral" não trabalha só para nós, já não nos é exclusivo.
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