domingo, junho 05, 2005

Gostaria de poder vir a ter Esperança… (II)

Por isso, no novo mundo em que vivemos, a Crise que se vive em Portugal não passa por continuar a gerir dentro da velha concepção da relação Estado – Cidadãos, por muito “modernizante” em que se mascare essa relação, nomeadamente sob a justificação da “solidariedade social” - como se está só pudesse ser apanágio dos Estados.

Historicamente, Portugal sempre foi um País com um Estado forte e centralizador (ultra - regulamentado) associado à fraca capacidade de exercício de cidadania por parte dos cidadãos.
O Estado Português (e as suas elites) sempre desconfiou dos “seus” cidadãos, em especial das suas iniciativas; sempre se achou a si mesmo (Estado) como “pessoa de bem” e os cidadãos como pessoas potencialmente “más” e incompetentes; incapazes de auto – governarem devidamente a sua vida e, muito menos, que, das suas iniciativas, pudesse emergir algo de “bom” para o País.

O pouco de cidadania que ainda terá “restado” à sociedade civil portuguesa sempre foi exercido sob forte controlo do Estado e sob sua tutela; a subsídio-dependência (que protege a aristocracia de serviços) não é de hoje; antes, terá tido outros nomes (corporativismo, entre outros!) e, eventualmente, não terá tido tanta preponderância e importância porque Portugal está mais aberto ao exterior e há que redistribuir, para além da riqueza anualmente produzida pelo País, os volumosos subsídios que vêm da União.

Se antes do 25 de Abril, Portugal tinha um Estado forte e centralizador (e ultra – regulamentado) associado a uma quase não – cidadania dos portugueses; depois do 25 de Abril continuamos com um Estado forte, ainda mais forte que antes (além de centralizador é muitíssimo mais ultra - regulamentado), e continua a haver um esmagamento no exercício da cidadania por parte dos cidadãos, em especial, do que não dependa do Estado.

O montante da riqueza nacional que anualmente é transferida de quem a cria (os cidadãos) para o Estado (cerca de 70% dos rendimentos ao longo da vida média) esmaga a capacidade de tomada de iniciativas por parte dos cidadãos.
A administração pública, fortemente regulamentadora e com o correspondente poder discricionário, actua, sistematicamente, sobre as iniciativas dos cidadãos com vista ao seu bloqueio ou à cata do dinheiro “por baixo da mesa”.
Os actos dos políticos, inclusive os autárquicos, são incontroláveis e irresponsabilizáveis, na prática, por parte da sociedade civil.

Se antes do 25 de Abril, o Estado Português era incontrolável e irresponsabilizável (ou seja, as suas elites); depois do 25 de Abril, continua quase tão incontrolável e irresponsabilizável.

Quando o Primeiro-ministro, Sócrates, anuncia o aumento de impostos e a preservação do investimento público para fazer face à Crise, não está a fazer mais que dar continuidade à concepção de sociedade (estado e sociedade civil) que os portugueses têm; está a decidir-se por soluções à Crise dentro do quadro societário que caracterizam a nossa sociedade.

A Primeiro-ministro não veio anunciar a diminuição dos benefícios da aristocracia de serviços (políticos, funcionários e instituições públicas e privadas que vivem à custa do Estado – dos impostos dos cidadãos); vem anunciar que todos temos de pagar as despesas dessa aristocracia de serviços e preservar o lugar que têm na sociedade portuguesa e o “bem” que nos têm feito!

De facto, a procura de soluções “diferentes”, mesmo para enfrentarem situações de Crise, é feita sempre dentro “do mesmo de sempre”, ou seja “o Estado faz – tudo”.

A diferença entre a esquerda e a direita, portuguesas, está apenas na acentuação mais paternalista ou mais autoritária que atribuem à forma de intervenção do Estado sobre a sociedade; num caso ou noutro o papel do cidadão é a ser passivo.
Aliás essa é a praxis na sociedade portuguesa; os cidadãos não controlam e ainda menos podem exigir responsabilidades ao Estado e à aristocracia de serviços.

Nunca poderá passar pela cabeça de um político português, de direita ou de esquerda, que a causa da Crise é precisamente a preservação do excesso de poder intervencionista do Estado associado ao esmagamento da capacidade de exercício da cidadania por parte dos cidadãos portugueses.

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